sexta-feira, 28 de junho de 2019

AMEI LER em Junho - "Lérias", Maria Thereza de Azevêdo Neves

NEVES, Maria Thereza de Azevêdo. Lérias. São Luís: 1ª ed. Gráfica Minerva, 2019.

“Pular corda ou correr com os cachorros? Resta-me cantar e me encantar, porque coração de avó é aquele que segura suas mãozinhas para sempre.”
(p.76)

Ao ser convidada para colaborar com uma coluna semanal no Jornal da Tarde em 2010, a primeira reação de Maria Thereza de Azevêdo Neves, que já havia se lançado como contista, memorialista e autora de histórias infantis, foi hesitar. Contudo, como observadora sensível que é, logo a escritora se entregou ao prazer do exercício cotidiano de comentar a realidade demonstrando também possuir domínio da arte da crônica.

No recém-lançado Lérias (2019), Maria Thereza reúne crônicas publicadas ao longo de dois anos no jornal, estabelecendo um diálogo franco, terno e gentil com os leitores. Aliás, é justamente por desejar transformar seu espaço no diário em um ambiente leve de “conversa mole” que a autora chama essa coletânea de “lérias”, que significa papo fiado. 

Acontece, porém, que é na despretensão que mora grande parte das reflexões mais bonitas que a vida nos fornece. Ao se permitir compartilhar conosco sua visão de mundo em primeira pessoa, Maria Thereza produz beleza. Como quando comenta a experiência de ser avó e revela uma perspectiva absolutamente singela sobre acolher as novas gerações de sua família; ou quando dedica palavras bem escolhidas ao resgate de memórias sensoriais da infância com gostinho de manga anajá. 
Entre os temas que interessam à autora estão ainda literatura (a autora fala das leituras de Isabel Allende e José Saramago), paixão, saudade, tempo, fé, cultura e cidades. Mas nem só de sutilezas se fazem as crônicas de Lérias, e conhecemos um lado atento ao calendário da ciência, da política e até do futebol! A autora brinca que sua agenda anual de comentários é ao avesso, por seus temas nem sempre coincidirem com as datas comemorativas, o que não deixa de ser mais uma forma inteligente de escapar do óbvio e surpreender com pautas inesperadas.

Disponível na Livraria AMEI

Destaco como ponto alto do livro a crônica “Maria das Rosas” (p.65) que retrata um fragmento de dia da autora perfeito para ser levado para o papel. A cena começa com um relato quase mal humorado de quem espera sua vez por uma consulta médica e se ilumina de repente com a entrada improvável de uma mulher que distribui gratuitamente florzinhas feitas à mão para todos os pacientes na sala de espera. 

“Ela falava serena: (...) ‘Sempre fui encantada com jardins, mas minha casinha termina logo na porta da rua. Foi por isso que comecei a fazer rosinhas. Vejo que todos gostam de recebê-las. Na minha rua, no meu bairro, nos bairros vizinhos, todos me conhecem por Maria das Rosinhas. Ganho sorrisos e amigos’.” (p.66)

Após a leitura que se desenrola com prazer pelo equilíbrio entre humor e crítica, lirismo e franqueza, fica a conclusão que para uma conversa que se pretendia não resultar em nada prático, as Lérias de Maria Thereza de Azevêdo Neves se aprofundam em bem mais do que despista não se comprometer.

Por Talita Guimarães

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