quinta-feira, 12 de março de 2020

AMEI LER EM JUNHO - "Ah, Vida Esteganográfica!": Sobre símbolos, rios, e talvez sobre (re)leitura.

Lorena Silva lê jambelfort

Todo livro é um oceano de símbolos a serem decifrados. Não apenas pela razão óbvia de que letras são signos (Oi, Saussure!), mas num sentido ainda mais amplo,quantos rios correm nas páginas de um livro? Vamos mais além: o livro que relemos é sempre o mesmo livro? E o leitor que lê o mesmo livro é o mesmo leitor a cada vez que relê? Complexo. Vem comigo no barquinho pelo rio onde ninguém se banha duas vezes.

Você lê um livro. E lê por quê? Há tantos tipos de leitura, cada um para seu objetivo. A leitura é um processo muito solitário, muito íntimo, e principalmente, subjetivo. Tantos significados podem ser atribuídos por cada par de olhos que encontra o texto... Vemos metas de leitura por todo lado, leitores que mostram ao mundo todo o que andam lendo, o que andam riscando da lista, por que mares bravios andam se aventurando. E para cada um deles, houve um objetivo e uma experiência. Então já podemos afirmar que o próprio livro não é o mesmo para cada leitor.


Contracapa de "Vida Decifrada" (2019)


Leitura também é técnica. Tal qual um marinheiro experiente, adquirido o hábito, sabemos os caminhos a tomar para tornar aquela experiência mais produtiva e até prazerosa, ou seja, para chegar à outra margem do rio. E quando se é um bom navegante, esse processo vai se naturalizando, podendo se aplicar a todos os tipos de corpos d'água (ou de palavras) que ele encontrar. Leitura também tem etapas. E nem sempre podemos navegar por todas elas: pulamos, queimamos, adiamos  e aí mora o perigo. Chama-se superficialidade. Ficamos ali seguros na superfície, vencemos as ondas, sobrevivemos à ressaca, mas morremos na praia. 

E então vem o momento de encarar novamente a correnteza, você revisita aquela leitura. Você tem consciência plena de que precisa absorver ainda mais daquele oceano, que há pontos nele que você ainda não domina por completo, ou simplesmente reconhece que, afinal, você não estava num bom momento para atravessar aquelas correntes. É quando você relê esse livro. E relê por quê? É um ponto delicado. Reler é um processo ainda mais complexo, pois demanda até certa humildade. 

Falo de humildade porque existe uma crença comum de que reler é retroceder. Mas a vida é feita de rascunhos, como não relê-la? Como é possível que um trabalho de anos de um autor ou autora escrevendo uma obra possa ser absorvido inteiro em apenas uma leitura? Como um marinheiro conhece um oceano inteiro se não viajou continuamente por suas ondas? Não parece lógico.

No entanto, o hábito da releitura comprova que um livro é esse vasto oceano, e nele desaguam tantos rios... Comprova ainda que você muda, sua mente muda, sua visão muda. E se não mudou, bem, é preciso ler mais e melhor - o que inclui o ato de reler, se for preciso. Não basta aprender a nadar. É preciso dominar as técnicas de respiração e postura para também mergulhar e ver o que há no fundo.

A leitura de jambelfort foi assim. A primeira leitura já impressiona pela habilidade do autor em mesclar tantos elementos em uma única narrativa. As próximas só nos levam a decifrar ainda mais os códigos desta vida esteganográfica, e nos cabe imergir cada vez mais fundo, para apreender todos os sinais que ela quer nos mandar, tal qual como um farol indicando os caminhos a seguir a todo navegante solitário.

Sigamos, bravos aventureiros! Não sejamos os mesmos a cada mergulho no mar das palavras.

Por Lorena Silva

A (mar)crônica inspirada pela (re)leitura de "Vida Decifrada" 
(jambelfort, Edição do Autor, 2019), em discussão no mês de Junho no CLUBE AMEI LER.

📚CLUBE AMEI LER DE JUNHO: jambelfort
📚 Data: 20/03/2020 (sábado)
📚 Horário: 18h
📚LIVE VIA INSTAGRAM: @clubeameiler




Um comentário:

  1. Tô tendo a mesma sensação! É um rio onde já nadei, mas ainda me impressiono como se fosse a primeira vez 😂

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